Buscar

Professor baleado expõe face trágica de violência em escolas

Suspeito é aluno que teria se revoltado com nota; Não lhe ensinei a lidar com revólver, diz tia de professor em carta

Professora, preste atenção, que comigo não são cinco tiros, são seis.

A frase foi dita por um aluno à professora Mariana*, em uma escola estadual em Sergipe, e faz referência ao trágico caso de um professor baleado em Aracaju no dia 12 de agosto.

Carlos Cristian Gomes estava na escola em que leciona Biologia quando foi atingido por cinco tiros. Ele continua internado em estado grave, respirando com ajuda de aparelhos.

A gente quer pensar que é brincadeira, mas nunca se sabe, conta Mariana. Por medo das consequências, a professora achou melhor não dar o nome do aluno à diretora da escola.

O suspeito de atirar contra Carlos Cristian é um aluno de 17 anos, que teria ficado revoltado com uma nota baixa. O caso foi destacado por leitores da BBC Brasil em nossas páginas de Facebook, Google+ e Twitter como um símbolo da violência contra professores no País.

A professora Mariana, conta que, depois de ser repreendido por ela, o aluno que ameaçou dar seis tiros não repetiu o comentário. Eu disse (ao aluno) que esse assunto não é algo com o que se brinque e que eu poderia levar a sério, ir à delegacia e fazer um boletim de ocorrência. E que, se qualquer coisa acontecesse comigo, o primeiro suspeito seria ele.

Alguns alunos se aproveitam da situação para amedrontar mesmo o professor. Se aconteceu com Carlos Cristian, pode acontecer com qualquer um. O professor fica vulnerável quando está dando aula.

IntimidaçãoDias após a tentativa de homicídio, professores fizeram uma manifestação na frente do Palácio de Despachos do governo de Sergipe contra a violência nas escolas. Pais, parentes e professores que atuam na região de São Cristóvão também fizeram uma passeata pela paz nas proximidades da escola Olga Barreto, onde ocorreu o crime.

O aluno suspeito de atirar contra o professor cursava a 8ª série da Educação de Jovens e Adultos (EJA), se apresentou recentemente à polícia e disse ter planejado o crime.

Ele disse que as questões na prova não correspondiam à revisão que o professor passou em sala de aula. Afirmou que comprou a arma e pediu ao professor uma segunda chance. Quando o professor disse que não era possível, ele atirou, disse à BBC Brasil a delegada Thereza Simony, responsável pelo caso.

Segundo Claudia Oliveira, que ensina Língua Portuguesa na Escola Olga Barreto há sete anos, o professor Carlos Cristian não havia se queixado de problemas de relacionamento com alunos. Ele é muito responsável em suas atividades, não falta, participa de projetos na escola. Não tinha motivo nenhum para o aluno agir dessa forma.

O rapaz não tinha comportamento agressivo com nenhum dos professores, mas era um aluno que faltava às aulas, não fazia as atividades. Ele ainda teria outra oportunidade para recuperar a nota, porque aquela era a primeira avaliação que fez, afirmou.

O Sintese diz que, apesar da situação de Cristian ser incomum, a relação entre professores, alunos, funcionários e diretores frequentemente se torna violenta.

Na maioria das vezes, a violência é verbal, mas às vezes descamba para a violência física, explica Joel Almeida, diretor de comunicação do sindicato.

Geralmente, com os alunos, (os conflitos) são (por) questões ligadas à nota. Com os professores mais severos, mais disciplinadores, é comum que existam ameaças ou mesmo depredação de bens. Alguns reclamam de terem carros riscados, pneus furados.

Eu fui vítima de algo semelhante no semestre passado. Alunos que não conseguiam ser aprovados ficavam horas na porta da minha sala me questionando e ameaçando. Mas conseguimos dialogar e resolver a situação, disse à BBC Brasil a professora Claudia Oliveira, diretora do Sindicato dos Professores de Sergipe (Sintese).

Solução?Para Almeida, o problema pode ser minimizado com investimento na infraestrutura das escolas e com mais engajamento dos professores. A comunidade escolar em Sergipe não se reúne para discutir a escola, seus problemas, como vai atuar sobre eles. A escola é um lugar em que o aluno e o professor chegam e saem, às vezes, sem muita relação com outras pessoas na escola.

O medo de possíveis atitudes extremas dos alunos também é um fator que impede que os docentes comuniquem seus problemas a outros, segundo Mariana. Acontecem muitas coisas nas escolas que ficam só no comentário entre os professores, cada um tem algo a contar. Muitas vezes, não levamos à direção por medo. Temos receio de que, mesmo que seja uma brincadeira, o aluno seja repreendido e acabe levando isso a sério.

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.